quarta-feira, 25 de maio de 2011

fotografia

a suely, minha prima querida, me mandou uma foto de um jantar na casa dos meus pais, quando eu tinha, provavelmente, cerca de doze anos. todos na foto olham para o fotógrafo, menos eu. não me nego a olhar para a câmera; meu olhar não é de raiva. é de distração. para onde olhava, aos doze anos? com o que me distraía? vejo nesse olhar a mesma curiosidade e divagação de que sou vítima e sujeito ainda agora. mas, certamente, naquele tempo, elas divisavam coisas que já não espero mais. quatro das pessoas da fotografia já não estão mais por aqui. a criança deve ser um senhor de meia idade. a casa já não é mais da família. o quadro da briga de galos desapareceu em algum lugar. a foto mesma foi parar na casa da minha prima, que, infelizmente, vejo tão pouco. distraio-me e divago hoje justamente com um passado que, ali, estava perdido no futuro. a fotografia do passado distante não só me faz ver quem eu era, mas também quem sou. não é só o passado que é uma sombra do que sou, mas também eu, no presente, sou uma sombra do que era.

9 comentários:

  1. Esta consciência, no que será que ela nos faz melhor? - pode ser que em nada, mesmo assim dá vontade de chorar...

    "O passado não reconhece o seu lugar: esta sempre presente." - Mário Quintana

    ResponderExcluir
  2. Lindo texto, Noemi. Será que seremos sempre uma sombra do que um dia fomos? Eu também vejo na minha infância nuances do que sou hoje. Quais ações e sentimentos de hoje irão definir quem serei amanhã?

    ResponderExcluir
  3. vítima e sujeito todos percebemos ser em algum instante, no entanto no papel de "populares" como diz Luis Fernando Veríssimo, pode ser mais interessante. é mais palatável.

    ResponderExcluir
  4. Você pode pensar isso de um outro modo: você sempre é você. Você não pode ser diferente de você. Você sempre existiu, e sempre foi você. Por mais que passe o tempo, você continua você. Eu prefiro entender vossa mercê assim.

    ResponderExcluir
  5. faltou a foto...
    belo texto.

    ResponderExcluir
  6. Concordo com camile, e me lembrei de álvaro de campos:'quem sou é quem me ignoro e vive através dessa nevoa que sou eu; todas as vidas que outrora tive, numa só vida...e só me encontro quando de mim fujo'.

    ResponderExcluir
  7. Estranho nos vermos no passado... muitas vezes não nos reconhecemos como os mesmos do presentes... muitas vezes ainda, a diferença é tamanha, que nos escondemos por vergonha, ou nos orgulhamos de termos simplesmente... passado...

    ResponderExcluir