sábado, 24 de setembro de 2016

caretice

necessidade de ordem é caretice. obsessão por resultados é caretice. desenvolvimento acima de tudo é caretice. dançar conforme a música é caretice. submeter-se às circunstâncias é caretice. conformar-se com o inevitável é caretice. achar que os fins justificam os meios é caretice. achar que deus dá o frio conforme o cobertor é caretice. pensar que deus ajuda quem cedo madruga é caretice. imaginar que o prazer é uma compensação pelo trabalho é caretice. acreditar que o só o esforço valoriza a conquista é caretice. dizer cada um com seus problemas é caretice. cada um por si e deus por todos é caretice. a caretice é uma doença e o remédio é desastrar-se.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

cu

amo palavrões: cu, buceta, caralho, bosta, merda, puta e suas derivações. concentram força, simbolismo e vitalidade e, ao mesmo tempo, conferem leveza e humor ao enunciado. "cu", por exemplo, seja em "vai tomar no cu", ou em "idiota é o teu cu", conjuga, em apenas duas letras, as ideias de segurança e de "não chega perto porque vou dar o troco". nesse sentido, "cu" está bem próximo de "caralho". já "merda" chega a imprimir à frase noções de lirismo, desamparo e pedido de ajuda. é só ouvir alguém dizer "merda" e sentir vontade de ajudar. com "bosta" ocorre algo semelhante. "puta" é altamente maleável e serve para elogios, reclamações, esquecimentos, tudo com alto teor de expressividade e afeto. palavrões são patrimônios da língua, sempre a postos para transformações, adaptações e novidades e sempre de forma sucinta e potente. vão sobreviver às palavras chatas, como "altissonante" e "de acordo" e o "fodido", coringa campeão, se deus quiser ainda enterrará o insuportável "ferrado".

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

suzi

meu cunhado trabalhava numa agência de publicidade que tinha a conta da k-suco. por isso ele conseguiu, clandestinamente, que eu ganhasse dois dos prêmios que vinham sendo oferecidos a quem encontrasse embalagens premiadas: uma boneca suzi e uma bola oficial de futebol. fui com minha mãe, de ônibus, até a fábrica da kibon, no morumbi. era bem longe do bom retiro, mas voltamos de lá com a boneca e a bola, que fez muito sucesso entre os meninos da classe, por ser oficial. eles vinham especialmente até minha casa para jogar com ela no quintal do prédio. da boneca eu não lembro nada. só da ida à fábrica e da bola, coisas que ainda estão aqui, ainda que vítreas.