terça-feira, 25 de agosto de 2009
comida
em mil novecentos e quarenta e quatro, quando já se anunciava ao longe a derrocada dos alemães, marguerite duras fazia parte da resistência francesa, seu chefe era françois mitterrand e seu marido havia sido capturado pela gestapo. ela, por uma estranha espécie de solidariedade, mas também por total impossibilidade, quase não comia e estava magra como um deportado. assustadoramente, um oficial nazista com veleidades artísticas se encantou por ela e a convidava para sair diariamente. preocupava-se com seu estado de saúde e a levava a restaurantes clandestinos onde se servia carne fresca e abundante, vinhos, batatas, leite. ela recusava tudo ou, para não levantar suspeitas, levava para casa e, ao chegar lá, jogava tudo no esgoto. me pergunto, com muitas dúvidas, se conseguiria fazer o mesmo. é impossível saber, mas tenho impressão de que não o faria e tenho raiva de mim por isso. sinto-me forte o suficiente para enfrentar muitas dificuldades e ousada para desafiar muitas coisas. mas aqui, empaco. a comida e sua carência, acho, eram o sinônimo da guerra. quem conseguiu resistir a ela, podia, como marguerite duras fez com orgulho, matar um nazista.
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